Brasil

O que a Copa tem a ver com as eleições

À exceção de 1994, a vitória da Seleção Brasileira em Copas do Mundo nunca mais coincidiu com a vitória ou derrota dos candidatos da situação à Presidência da República. Os eventos são independentes, demonstrando que, no âmbito nacional, a interface entre futebol e política passa longe da possibilidade de alavancar a popularidade de governos e as candidaturas que sustentam.

Foi a partir da segunda eleição presidencial pós-redemocratização, em 1994, que a Copa do Mundo e as eleições gerais ocorrem no mesmo ano. E foi aquela única vez, ano em que no governo Itamar Franco o Plano Real foi lançado, que o Brasil se sagrou campeão na Copa dos Estados Unidos e, na sequência, o candidato da situação, Fernando Henrique Cardoso (PSDB), elegeu-se presidente da República. Naquele ano, Fernando Henrique surfou no plano econômico que estabilizou a moeda, vencendo o pleito em primeiro turno contra o principal adversário, Lula (PT), que, antes do lançamento da nova moeda iniciara a campanha em vantagem.

Mas 1994 é um resultado que não pode ser atribuído à vitória da Seleção Brasileira nos gramados norte-americanos: outro evento muito mais poderoso impactou a opinião pública, conforme demonstra uma série de estudos eleitorais, que analisam a correlação entre o bom desempenho econômico e o sucesso nas urnas de candidatos da situação. Ao controlar a inflação – que em 1993 alcançara 2.780,6% –, o Plano Real produziu impacto eleitoral parecido com aquele verificado com o Plano Cruzado, lançado por José Sarney em fevereiro de 1986, ano de eleições para governador, assembleias estaduais e Congresso. Era a resposta do governo federal à inflação acumulada do ano de 1985, que alcançara 235,11%.

Com o Cruzado que prometia estabilidade de preços e, nos primeiros meses, mobilizou a população em sua defesa, o governo Sarney que antes patinava na opinião pública, disparou em popularidade, carregando 22 governadores eleitos, a maioria dos senadores, deputados federais e deputados estaduais. Foi um tempo em que o país ainda sofria com os resquícios da recessão democrática e sonhava com as eleições presidenciais que voltariam a acontecer em 1989.

De 1998 em diante, não houve Copa do Mundo que convergisse a torcida brasileira e candidatos da situação na mesma direção. Os eleitores racionais escolheram nas urnas os candidatos para governar o país que identificaram com o seu melhor interesse, principalmente a partir de sua experiência de vida, mais uma vez comprovando que o resultado das eleições presidenciais e Copa do Mundo não têm correlação direta.

O presidente Fernando Henrique se reelegeu em 1998, o Brasil chegou à final da Copa na França, mas perdeu para o anfitrião. Já em 2002, a Seleção Brasileira sagrou-se campeã contra a Alemanha na Copa realizada na Coreia do Sul e Japão. Mas quem levou a Presidência da República foi o candidato da oposição, Lula, embalado por um conjunto de variáveis, principalmente econômicas, que se combinaram com o chamado apagão energético.

Em 2006, a Itália ganhou a Copa na Alemanha, e o então presidente Lula se reelegeu, inclusive em meio à celeuma do mensalão, o que sugere que não foi a Copa nem a pretensa pauta da corrupção que influenciaram o pleito. Já em 2010, Brasil perdeu na África do Sul, e a situação reelegeu a candidata da situação Dilma Rousseff.

Em 2014, apesar da campanha “Não vai ter Copa”, o Brasil sediou o torneio, perdeu feio, e Dilma foi reeleita com margem que já vinha se estreitando ao longo da primeira década do milênio, à proporção em que arrefecia o crescimento econômico. É assim que, se as Copas não ajudam governos a eleger os seus sucessores, também, por analogia, são incapazes de produzir milagres e levantar a avaliação de presidentes impopulares.

No caminho inverso, do gramado para as urnas

Se os resultados da Seleção Brasileira nas Copas do Mundo não têm influência sobre o desempenho eleitoral de candidatos apoiados pelo governo federal na sucessão ao Planalto, no plano individual, muitos jogadores, jornalistas e cartolas que ganharam visibilidade no futebol conquistaram mandatos. Na experiência mineira, o caso mais recente foi o de Alexandre Kalil, ex-presidente do Clube Atlético Mineiro, outsider eleito prefeito de Belo Horizonte em 2016, inclusive derrotando, na capital mineira, os tradicionais grupos políticos adversários tucanos e petistas.

Kalil construiu a sua trajetória, o seu estilo, numa atividade que mobiliza paixões. Popular e bastante conhecido por feitos como dar ao Galo a Libertadores da América, nas eleições de 2016, sagrou-se prefeito em um novo formato da disputa eleitoral, que encurtou a campanha e proibiu o financiamento privado. No segundo turno da disputa, Kalil derrotou outro político que iniciou a sua carreira no mundo da bola, mas que consolidou uma trajetória independente na política: o deputado estadual João Leite (PSDB), em seu sexto mandato consecutivo na Assembleia Legislativa.

Dentro da lógica da visibilidade conquistada no esporte que, de longe, é a maior “paixão nacional”, nas eleições de 2014, 30 candidatos se tornaram conhecido e se lançaram país afora, para as eleições a senador, deputado federal e estadual.Treze tiveram sucesso eleitoral.

Em Minas Gerais, além de João Leite, Mário Henrique Caixa, popular narrador dos jogos do Atlético, foi o segundo deputado estadual mais votado no estado. Eleito pelo PCdoB, Caixa agora está no PV. Ainda na Assembleia Legislativa de Minas, Alencar da Silveira (PDT), dirigente do América, foi eleito para o quinto mandato e concorrerá novamente este ano.

Entretanto, na briga para deputado estadual não conseguiram repetir o sucesso nas urnas, o ídolo Reinaldo, que concorreu pelo PTdoB, e Marques, pelo PTB. O cartola estreante Gilvan Tavares de Pinho (PV), que foi dirigente do Cruzeiro, não conseguiu conquistar mandato.

Entre as estrelas do futebol que se elegeram ao Senado, Fernando Bezerra (PSB, agora no MDB), foi presidente do Santa Cruz entre 2008 e 2009 e, no Rio, Romário, pelo PSB, com 4.683.963, arrebanhou três vezes mais votos do que o favorito na disputa, o ex-prefeito César Maia (DEM). Atualmente no Podemos, Romário segue na carreira política: já lançou a sua pré-candidatura para as eleições de outubro ao governo fluminense.

Para a Câmara dos Deputados, se elegeram em 2014 o ex-presidente do Corinthians, Andrés Sanchez, o mais votado candidato do PT de São Paulo; no Paraná, Evandro Rogério Roman (PSD), ex-árbitro de futebol; e, no Rio Grande do Sul, Danrlei (PSD), ex-goleiro do Grêmio. Também entre os gaúchos, conquistou o quarto mandato de deputado federal Deley, pelo PTB, que, este ano, continua na carreira política.

Foram deputados estaduais eleitos, Bebeto (PDT), ex-jogador da Seleção, que se reelegeu para a Assembleia Legislativa do Rio; Jardel (PSD), que conquistou uma cadeira na Assembleia Legislativa gaúcha; Fernando Capez (PSDB), promotor público que ganhou notoriedade por encetar guerra contra as torcidas organizadas, obteve em 2014 o terceiro mandato para deputado estadual em São Paulo. A Bahia elegeu Bobô, ex-jogador do Bahia e administrador da Fonte Nova. No Ceará, o cartola Evandro Leitão, pelo PDT, ganhou uma cadeira no Legislativo, assim como Zé Augusto, pelo PTdoB (atual Avante).

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