Farra com dinheiro público

Brasileiro pagará R$ 3,7 bilhões para partidos fazerem campanha em 2020

Enquanto o Brasil mira os olhos na votação da reforma da Previdência, aprovada na Câmara dos Deputados, corre pelos escaninhos da casa um projeto que amplia em 85% o valor do Fundo Eleitoral – dinheiro público que será utilizado para bancar as campanhas dos candidatos que disputarão os cargos de prefeito, vice-prefeito e vereador nos mais de 5 mil municípios brasileiros. De acordo com a proposta incluída na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o montante saltará de R$ 2 bilhões para R$ 3,7 bilhões.

O valor corresponde a 12% do que é destinado ao Bolsa Família – programa que atende a 14 milhões de brasileiros. O Programa Mais Médicos, que alcança mais de 60 milhões de pessoas, custou aos cofres públicos, até o final de junho, R$ 1,33 bilhão (conforme o Portal da Transparência do governo federal). O orçamento do Minha Casa Minha Vida para 2019 é de R$ 4,1 bilhões.

Brasil tem 33 partidos registrados e mais de 70 na fila

Os números acima demonstram o tamanho da fome dos partidos políticos brasileiros. E dão pistas, também, do motivo de termos tantas agremiações políticas no Brasil. Atualmente, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), existem 33 partidos no País. Existe, no tribunal, uma lista com mais de 70 pedidos de registro de novas legendas – entre os proponentes, estão o Partido Alternativo do Trabalhador, o Iguais, o Partido das Sete Causas e o Partido Nacional Corinthiano.

Nem todos, porém, têm acesso ao dinheiro retirado do Tesouro Nacional para bancar campanhas políticas. Há critérios como atingir ao menos 1,5% dos votos válidos nas eleições para a Câmara dos Deputados e eleger no mínimo nove deputados federais distribuídos em nove Estados ou o Distrito Federal. A atual polarização política no Brasil reforça a dúvida de que o espectro ideológico seja tão diversificado para justificar a necessidade de tantos partidos políticos assim.

Fundo terá R$ 25 por eleitor

Projeções feitas pelo jornal O Globo mostram quais são os partidos que terão a maior fatia do bolo servido na forma de Fundo Eleitoral: PT, com R$ 366,7 milhões; PSL, com R$ 366,2 milhões; MDB, com R$ 282,83 milhões; e PSD, com R$ 262,83 milhões.

Em termos per capta, os valores nem são tão exorbitantes. O Brasil, segundo dados do TSE, tinha 147,3 milhões de eleitores registrados em 2018. Isso significa que, caso o valor incluído na LDO seja aprovado no Congresso, serão gastos aproximadamente R$ 25 por eleitor.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), disse que o custo não é exagerado, pois são mais de 5 mil municípios e milhares de candidatos. Nas últimas eleições municipais, em 2016, foram inscritos 16.818 candidatos a prefeito e 461 mil a vereador.

Ocorre que o Fundo Eleitoral não é o único gasto que sai dos cofres públicos para os partidos. Há, ainda, o Fundo Partidário, oficialmente chamado de Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos. Em 2019, R$ 927 milhões para 21 partidos. Ou seja, juntos, os dois fundos chegarão a quase R$ 5 bilhões em 2020.

Outro ônus geralmente esquecido está relacionado ao Horário Eleitoral Gratuito, que só é gratuito para os partidos, não para os pagadores de impostos. As emissoras de rádio e televisão podem pleitear compensações fiscais pelo horário cedido. Cálculos da Receita Federal apontam que, em 2018, essas isenções chegaram a R$ 1 bilhão.

Vá somando…

Financiamento público foi instituído em 2018

O financiamento público de campanha foi instituído no Brasil em 2018. Até as eleições de 2016, as empresas podiam doar para candidatos e partidos. Porém, após anos de denúncias de corrupção, com barganha entre grandes empreiteiras com agentes políticos, baseada na troca de doações eleitorais (boa parte por meio de caixa 2) por contratos públicos, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu proibir a prática. Em seguida, o Congresso aprovou a legislação atual.

A tese que prevaleceu é a de que as empresas só entravam no jogo com a intenção de se beneficiar de conchavos com os eleitos. Para combater esse mal, foi então adotado o financiamento público. Inclusive, na maioria dos países democráticos há alguma forma de aporte estatal nas eleições.

A alteração nas regras do jogo, portanto, tem sentido. Difícil é engolir um aumento de 85% ao mesmo tempo em que o trabalhador percebe que a aposentadoria torna-se cada vez mais um sonho distante. Difícil é aceitar quando o País está atolado em uma crise que gera mais de 13 milhões de desempregados e que parece nunca acabar.

Além disso, a simples alteração não garante que o caixa 2 deixe de ser praticado e não há qualquer indício de que a corrupção envolvendo empresas e o Estado tenha arrefecido após a adoção do financiamento público de campanhas. O problema nunca foi o sistema, mas, sim, seus operadores.

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